31/08/2010

Um prêmio que envergonha uma nação


Minha falecida mãezinha – cujo doce espírito deve estar neste exato momento sentado ao meu lado, lendo estas mal traçadas linhas – sempre dizia que “o pior cego é aquele que não quer ver o que acontece ao seu redor”. Estas sábias palavras ecoam na minha cabeça depois de assistir a uma das mais patéticas atrações televisivas dos últimos tempos.

Certa vez, escrevi aqui mesmo no Yahoo! Brasil um texto chamado “Prêmios não servem para nada”, mas tenho que admitir que mudei de opinião depois de assistir às grotescas cenas ocorridas durante aquilo que deveria ser um dos maiores eventos da música brasileira – o Prêmio Multishow 2010 – que ocorreu na semana passada. A julgar por aquilo que vi ali, um prêmio também serve para envergonhar um País inteiro.

A começar por uma série de inacreditáveis falhas de organização, dignas de um show de quermesse de oitava categoria. “Patético” talvez seja o melhor adjetivo que posso encontrar para definir o evento, um verdadeiro antro de felicidade de plástico, exibicionismo canhestro, premiações absurdas e o que é pior: um retrato límpido e cristalino do que chamamos hoje de “juventude televisiva”.

É isso o que dá organizar uma premiação em que o vencedor é escolhido pelo público. Sem nenhum controle, o resultado é baseado na ação tresloucada dos fãs clubes, formados em sua maioria por débeis mentais que passam semanas inteiras votando em seus objetos de paixão, até ficarem com o dedo em carne viva de tanto teclar no telefone. Imagine o desespero dos pais na hora que chega a conta… Isso sem contar o fato de que certos artistas contratam empresas especializadas em fazer o serviço das ligações – como você acha que certos zé-manés e pseudoartistas ganham os reality shows da vida?

Mesmo o telespectador normal, que só ouve música quando toca na rádio ou quando assiste a um desses programas dominicais, ficou incrédulo, perguntando a si mesmo se realmente foram aquelas pessoas que se destacaram na música brasileira nos últimos dois anos.

O constrangimento começava com a dupla de apresentadores, Bruno Mazzeo e Fernanda Torres, que aparentavam estar com uma enorme vontade de estarem longe dali, talvez em uma sessão de teatro ou até mesmo em um churrasco. Fernanda chegou ao cúmulo da desatenção ao chamar ao palco para receber um prêmio artistas que, na verdade, ganhariam em outras categorias até então não anunciadas. Além disso, ignorou a presença do saxofonista de Ivete Sangalo no palco.

O músico estava ali para representar a cantora baiana no recebimento de um prêmio – até mesmo Ivete sacou que seria uma “roubada” participar desta presepada –, mas Fernanda ratou de chamar logo os próximos convidados, talvez ansiosa por sair dali o mais rápido possível.

Já Bruno Mazzeo anunciou uma apresentação de Claudia Leitte e Victor & Leo sem que os cantores estivessem prontos para entrar em cena, o que o levou a improvisar um ridículo stand up comedy ao vivo – se bem que ouvir a versão que a cantora e a dupla fizeram de “Pais e Filhos”, da Legião Urbana, foi um troço muito pior. E os Titãs, então, que foram “homenageados” na cerimônia por uma banda de mulheres que começou a tocar sem que a vocalista escalada, Maria Gadu, estivesse no palco? Uma bagunça total!

Nem vou perder o meu tempo – e desperdiçar o seu – comentando sobre os disparates nas premiações, representadas por um troféu horroroso, que mais parecia um halter de plástico, que a produção deve ter comprado aos quilos nas “lojinhas de R$ 1,99” espalhadas por qualquer capital, mas… Olha, premiar Rodrigo Tavares, o baixista do Fresno, como “Melhor Instrumentista”, foi um escárnio tão grande que mesmo o ganhador se sentiu envergonhado com a escolha. Foi o mesmo que dar o prêmio de “Melhor Carnívoro” a uma capivara… E ver um manifesto clássico como “I Love Rock and Roll”, da Joan Jett, ser massacrado pelos caras do Cine junto com uma tal de Lu Alone. Deu vontade de sair por aí recolhendo todas as giletes do meu bairro, tão preocupado fiquei com um possível surto de suicídios coletivos.

A verdade é que há tempos tais premiações se transformaram em um balaio de gente que só faz “tipinho” em frente às câmeras – embora alguns também façam o mesmo na vida real, o que é ainda mais ridículo. É o tipo de coisa que só encontra eco em cérebros desmiolados, que ainda se impressionam com o “mesmo de sempre”, que passam grande parte de suas medíocres vidas a sentar suas bundas gordas e flácidas na frente da TV ou do computador e receber doses maciças de imbecilidade.

Ainda bem que você não é assim, né? Não é? Hein?

Texto de Regis Tadeu

Regis Tadeu é editor das revistas Cover Guitarra, Cover Baixo e Batera, diretor de redação da Editora Aloha, crítico musical/jurado do Programa Raul Gil e apresenta/produz na Rádio USP (93,7) o programa Rock Brazuca.

3 comentários:

Anônimo disse...

Gosto das opiniões desse cara. infelizmente só é ouvido em escrotos programas televisivos - e não levado à sério - como: " Raul Gil " e " Luciana gimenes "

Diego Moraes

João Rodriguez disse...

Realmente mano...é vergonhoso mano...tanta banda nova boa e ISSO que se chama de banda ganhando prêmios.

http://guarinistp.wordpress.com/ <<--Da uma olhada depois

Abraço

Ericson disse...

Que resenha do C......!!! Parabéns Régis.

Postar um comentário

 
Manifesto Rock - Música, Cultura Pop e Subversão © LDM